“Leôncio achara desde a infância nas larguezas e facilidades de seus pais amplos meios de corromper o coração e extraviar a inteligência. Mau aluno e criança incorrigível, turbulento e insubordinado, andou de colégio em colégio e passou como gato por brasas por cima de todos os preparatórios, cujos exames, todavia, sempre salvara à sombra do patronato. Os mestres não se atreviam a dar ao nobre e munífico comendador o desgosto de ver seu filho reprovado. Matriculado na escola de medicina logo no primeiro ano enjoou-se daquela disciplina, e como seus pais não sabiam contrariá-lo, foi para Olinda a fim de frequentar o curso jurídico. Ali, depois de ter dissipado não pequena porção da fortuna paterna na satisfação de todos os seus vícios e loucas fantasias, tomou tédio também aos estudos jurídicos e ficou entendendo que só na Europa poderia desenvolver dignamente a sua inteligência e saciar a sua sede de saber, em puros e abundantes mananciais. Assim escreveu ao pai, que deu-lhe crédito e o enviou a Paris, donde esperava vê-lo voltar feito um novo Humboldt. Instalado naquele vasto pandemônio do luxo e dos prazeres, Leôncio, raras vezes, e só por desfastio, ia ouvir as eloquentes preleções dos exímios professores da época e nem tampouco era visto nos museus, institutos e bibliotecas. Em compensação era assíduo frequentador do Jardim Mabile, assim como de todos os cafés e teatros mais em voga, e tornara-se um dos mais afamados e elegantes leões dos bulevares”.
GUIMARÃES, Bernardo. A Escrava Isaura. São Paulo, Editora Ática, 17ª edição,1991.
01. O tema do texto é: